22 de julho de 2021 a 14 de agosto de 2021

O Todo em Si – Silvia Mecozzi

Galeria ARTEFORMATTO - Fazenda Boa Vista Market

Os trabalhos de Silvia Mecozzi mostrados na galeria ARTEFORMATTO foram feitos em momentos diferentes, e partem de questões variadas que ela vem elaborando ao longo de sua trajetória. São peças diversas: palmas, corações e chifres esculpidos, orbes vermelhos translúcidos, e um políptico feito de palavra, cera, tecido, tripas, ouro e osso. Juntas ali, essas peças constroem um sistema de significados. Espacializam um modo de pensar e apreender o mundo que é próprio da arte; que entende as coisas com as mãos e com a técnica, por meio do fazer. Essa forma de conhecimento, em que a artista decanta sua experiência no trabalho – e portanto em seu próprio corpo -, é uma atitude fundamental para quem pretende se manter com vida e sanidade em meio ao caos e as distâncias que nos separam. Seus trabalhos são assim porque quando feitos – e quando vistos – de alguma forma recuperam uma atenção para as coisas do mundo, por sua materialidade, se afeiçoando a elas.
No políptico, cada matéria, cada elemento e gesto está ali na tentativa de compreender o que escrevem Ailton Krenak e Davi Kopenawa. De aprender em seu corpo, a partir de seu trabalho, o que outras pessoas têm a lhe ensinar. Assim, Silvia Mecozzi senta em seu ateliê, e se dedica pacientemente a transcrever as palavras desses dois autores por meio da pintura. Faz da letra e seus significados o motivo de seu trabalho. E, aos poucos, nesse diálogo, vai construindo um sistema de sentidos e analogias. Carrega consigo seu repertório, memórias e modos de fazer. E, a partir deles, procura se abrir – escutar – entender outras possibilidades de se estar no mundo. Tinta, osso, ouro, cera e até tripas, são juntados nesse trabalho de compreensão. Ao notar cada uma dessas partes, uma parcela do que afeta a artista ressoa em nós e somos convidados, como ela (por ela), a ter a mesma disposição de aprender.
Essa disposição também está nas esculturas de mármore. Sobre a pedra de Carrara, Silvia Mecozzi, abre veios e trilhas, conhecendo o material enquanto dá forma a ele. Esse elemento duro, pouco a pouco vai ganhando uma maciez que constrói paisagens e sentidos. São lugares conhecidos: palmas da mão, um coração enorme, o chifre de um bicho. Ao fazê-los a artista compreende os corpos que está representando – se aproxima deles – e também os enfrenta a partir da resistência da pedra. Cheguei no corpo-pedra, nos diz ela.
No sistema de significados que constitui esta exposição, também tem lugar a atenção ao gesto. Vemos o gesto cavar o mármore para nos dar o coração e as mãos. Compreendemos o gesto em direção a palavra, na tentativa de assimilá-la. E podemos analisar o gesto suspenso no ar, na peça formada por duas cúpulas, uma dentro da outra. É ele que conforma a pequena gravura feita com uma matriz de metal, nela a linha constrói a mancha, e então um pequeno cosmos, que se revela em toda a sua integridade. É essa mesma linha então que costura peles, significados ou destinos quando vista nas palmas.
Texto por Yuri Fomin Quevedo

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